Se falta algo importante pode-se não terminar a viagem, e se tiver levado muita coisa talvez tenha que deixar algum excesso no caminho, o que geralmente acontece. O importante é ser o mais minimalista possível, sem espaço para luxos ou apegos. Desapego é o primeiro aprendizado.

© Fábio Negrão

O segundo aprendizado é adquirir a coragem para partir. Sair de casa para uma viagem de bicicleta é um desafio e tanto. Ter a coragem de largar a zona de conforto e partir para o incerto em um veículo pouco utilizado para viajar, além de dividir a mesma estrada (no caso da bike, que utiliza o acostamento na maioria dos casos) com carros e caminhões enfurecidos pode parecer assustador. Ainda mais em uma bicicleta, onde todos ao seu redor não entendem por que você não vai de carro, ônibus ou avião, porém você não liga para isso e acredita em sua maneira alternativa de viajar sabendo que é possível. E a partir desse momento as portas se abrem para o “mundo” e as coisas acontecem. A bicicleta abre portas.

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Digo que abre portas pois quando se pedala, e com uma bike carregada (geralmente com alforges), você chama atenção. Como sua velocidade é baixa se comparado ao ônibus ou carro, isso permite parar em qualquer lugar e ter um contato maior com as pessoas. E nisso a magia acontece. A maioria das pessoas desconhece uma viagem de bicicleta e a curiosidade é grande. Muitos se solidarizam com a viagem. E vão falar contigo. Eu tive convites para almoçar em casa de famílias, e também em restaurantes. Além das inúmeras vezes que me deram frutas, biscoitos, água, suco, refrigerante. Houve vezes que eu até tive que recusar, pois não cabia mais no alforge. Ouvi relatos de pessoas que ofereceram até dinheiro para ajudar na viagem. Compaixão é o terceiro aprendizado, estar no lugar do outro.

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“A maioria das pessoas desconhece uma viagem de bicicleta e a curiosidade é grande.”

Pedalar muitas horas em um ritmo considerado lento, se comparado ao ciclismo de estrada ou MTB, faz acalmar a mente e relaxar profundamente. Havia dias que pedalava sete, oito horas e no final do dia havia cansaço, mas não esgotamento. Sentia a enorme felicidade que o dia de pedal proporcionou, seja porque presenciava uma paisagem linda, pessoas que conheci no caminho, um delicioso almoço ou simplesmente parar em qualquer lugar para sentar e relaxar. Relaxamento profundo é o quarto aprendizado.

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Simplicidade e humildade são o quinto aprendizado. Se existe uma coisa que você aprende ao viajar de bike é ser simples e humilde. A bicicleta por si só é uma máquina muito simples, e para o cicloturismo não se precisa da uma bike top, comparada ao ciclismo de competição e competições de mountain bike. Na viagem, minha bicicleta era uma dobrável aro 20, e no caminho por minha viagem de quase dois anos pela América do Sul pedalei ao lado de bikes MTB aro 26 ou 29 e nunca senti que ter uma bike mais lenta fosse um problema. Pois, literalmente, em uma viagem quanto mais lento você viaja mais aprecia ao seu redor e o prazer e o relaxamento são maiores. Pode-se viajar com bike cara e equipamentos caros, é claro, mas penso que a personalidade do cicloturista está mais para um estilo desapegado e disposto a dar valor as coisas como a amizade, solidariedade, alimentação simples, dormir em lugares simples e acampar, apreciar a natureza, gostar muito de pedalar e sentir o vento na pele.

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