“Hoje no país,a cadeia produtiva da bike gera mais de 25 mil empregos diretos. Além de seis mil estabelecimentos de atacado e varejo que dependem da bicicleta. Isso são números muito importantes para mudar o olhar sobre a bike. A economia que famílias poderiam fazer ao adotar a bike como meio de transporte é outro ponto forte. Esse dinheiro economizado poderia ser usado para educação e lazer dessas pessoas, por exemplo” – Victor Andrade, coordenador da pesquisa e do LabMob

Atrair a atenção do poder público para a bicicleta e fazer com que ela ganhe força nas cidades como meio de transporte e de transformação urbana virou uma meta constante de cicloativistas e instituições privadas que apostam na bike. Nessa busca, a cada dia surgem mais e mais pesquisas sobre a viabilidade do pedalar. No VeloCity 2018, o maior congresso mundial sobre o uso de bikes, realizado recentemente no Rio de Janeiro, pela primeira vez na América Latina, foi apresentada a pesquisa A Economia da Bicicleta no Brasil, um diagnóstico nacional e inédito sobre o potencial econômico do pedalar, elaborado pelo Laboratório de Mobilidade Sustentável (LabMob) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike), com apoio financeiro do Banco Itaú Unibanco, patrocinador do VeloCity 2018. Uma forte estratégia para convencer gestores públicos e políticos a ampliar a malha cicloviária das cidades, já que os aspectos social e ambiental do uso da bicicleta não têm sido suficientes até agora.  

O estudo, realizado em 24 cidades brasileiras, 12 delas capitais (o Recife entre elas), mostrou que vale a pena sim o poder público investir no uso da bicicleta. Não só porque ela é politicamente correta ou faz bem à saúde, mas porque é economicamente viável. Uma família que ganha de três a sete salários mínimos, por exemplo, poderia ter uma economia anual de R$ 12.831,68 se pelo menos um dos integrantes trocasse o carro pela bicicleta para se deslocar diariamente. Se a mesma família substituísse o gasto com os apps de transporte privado, como Uber e 99, essa economia seria de R$ 10 mil. 

Os ganhos do uso da bike não param por aí, segundo a pesquisa. Sob a ótica do impacto no meio ambiente, os dados também são positivos. O estudo mostra que os 8 milhões de ciclistas hoje identificados no país promovem uma redução do consumo de gasolina no valor de R$ 291 milhões, considerando o total de quilômetros rodados no ano. Em relação ao diesel, essa redução é de R$ 80 milhões/ano.

Infraestrutura

“Existe uma grande demanda reprimida querendo experimentar a bicicleta como meoi de transporte, mesmo que para pequenos deslocamentos, complementares ao ônibus ou ao metrô, por exemplo. Por isso estamos nos munindo de dados estatísticos para mostrar a viabilidade da bicicletae a necessidade de se criar ciclovias e ciclofaixas nas ruas para oferecer segurança a quem quer pedalar” – Simone Gallo, gerente de relações institucionais do Itaú

Por trás das pesquisas que vêm sendo feitas sobre a viabilidade do pedalar, está a tentativa de atrair mais e mais pessoas para usar a bicicleta como transporte, desafogando e humanizando as cidades, sempre tão dependentes do automóvel. E já é consenso que a infraestrutura é o ponto principal para essa mudança acontecer. As pessoas têm medo de pedalar nas ruas sem proteção do tráfego de veículos. Essa é a grande questão. E o estudo do LabMob e da Aliança Bike mostrou que muito pouco foi feito para ampliar a malha cicloviária das cidades. No total, até hoje, o Brasil investiu R$ 1,2 bilhão na implantação de três mil quilômetros de ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas nas capitais brasileiras. 

“O total de investimento em infraestrutura pode parecer muito, mas não é. É muito pouco. Para ser ter ideia, a capital que mais investiu em infraestrutura cicloviária per capita foi Rio Branco, no Acre, com R$ 111 por habitante. São Paulo investiu apenas R$ 25. Enquanto que na recuperação de pavimento das ruas da atual gestão municipal os investimentos foram três vezes maiores do que o destinado à ciclomobilidade em toda a história da cidade. Isso é absurdo”, destaca Victor Andrade.

Simone Gallo, gerente de relações institucionais do Itaú, reforça o papel de transformação embutido no estudo. “Mais de 95% das pessoas entrevistadas em pesquisa recente na cidade de São Paulo, também realizada com apoio do Itaú, afirmaram que pedalariam se houvesse infraestrutura cicloviária nas ruas. E com certeza esse percentual deve ser aproximado em muitas cidades brasileiras. Ou seja, existe uma grande demanda reprimida querendo experimentar a bicicleta como transporte, mesmo que para pequenos deslocamentos, complementares ao ônibus ou ao metrô, por exemplo. Por isso estamos nos munindo de dados estatísticos para mostrar a viabilidade da bicicleta e a necessidade de se criar ciclovias e ciclofaixas nas ruas para oferecer segurança a quem quer pedalar”, argumenta.

Na contramão do investimento na infraestrutura cicloviária estão os sistemas de compartilhamento de bicicletas, que só crescem no país. O estudo A Economia da Bicicleta no Brasil mostra que já são 13 capitais brasileiras que possuem sistemas de bike sharing, totalizando 7.861 bicicletas disponíveis para aluguel. Um sistema que tem crescido no país, mas que ainda não consegue atender à população de baixa renda nem se expandir além das áreas nobres e centrais nas cidades. Assim, deixam de atender o perfil do ciclista que mais precisa da bike por usá-la para deslocamentos ao trabalho.

“Mas é preciso ir além dos sistemas de bike sharing. Eles já são referência nas cidades onde estão disponíveis. Precisamos de novos parceiros interessados nesse projeto que tem dado tão certo para ampliar as estações e os modelos de compartilhamento pelo Brasil, estimulando o pedalar. Mas é fundamental o investimento, agora, na infraestrutura cicloviária”, pontua Simone Gallo.