O usuário de uma bicicleta elétrica possui demandas semelhantes ao usuário de uma bicicleta convencional. Espaços seguros para circular, cidades mais humanizadas e mais respeito aos meios de transporte alternativos ao automóvel são anseios de ambos. Neste mesmo raciocínio, a experiência do deslocamento também é semelhante, mais sociável, com melhor interação e equalização de tempo x espaço. Essa familiaridade torna a bicicleta elétrica uma aliada na manifestação e expansão da cultura ciclística.

Já é bastante comum você cruzar com uma bicicleta elétrica nas mais diversas regiões do país, em cidades pequenas do interior até os mais badalados destinos turísticos litorâneos. Sua popularização, especialmente em cidades com relevo mais acidentado e entre pessoas com maior limitação física, colocou sobre duas rodas um público que até então não utilizava bicicletas – ou as utilizava com menos frequência. “Moro em Niterói, trabalho no Centro do Rio e sempre chegava atrasado por causa dos congestionamentos. Para fugir do trânsito da Ponte e imediações, levo minha bicicleta elétrica na barca e vou com ela até o escritório. Chego na hora e sem suar muito”, afirma o gerente de loja Edwaldo Knupp.

É justo, então, creditar às bicicletas elétricas sua colaboração ao fomento da cultura ciclística. O Rio de Janeiro, cidade de Edwaldo, foi classificada recentemente como terceira capital com piores congestionamentos do mundo, em pesquisa realizada pela empresa holandesa TomTom. Para fugir dos problemas do trânsito e à procura de um estilo de vida mais saudável, muitos como ele têm adotado as bicicletas elétricas como forma de locomoção. Segundo o diretor da marca RioSouth, Thiago Zhang, “os modelos de bicicletas elétricas e dobráveis estão sendo cada vez mais procurados, pois além de serem rápidos, são fáceis de carregar na mala do carro, no metrô, trem, barcas ou outro transporte público”.

Esses novos “ciclistas elétricos” amplificam as reivindicações dos pedalantes, como a necessidade de infraestrutura e de respeito a quem opta pela bicicleta no cotidiano, e contribuem para uma cidade que flui de maneira mais inteligente e organizada. Ainda tendo o Rio como exemplo, “a geografia plana, a orla e as ciclovias espalhadas em vários pontos da cidade, permitem ao carioca pedalar de um bairro ao outro sem grandes problemas. Um morador da Barra da Tijuca, por exemplo, pode estacionar o seu carro na Zona Sul e circular de bicicleta pelo Centro da cidade”, sugere Cláudio Santos, presidente da Fecierj (Federação de Ciclismo do Estado do Rio de Janeiro).

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Com o mesmo efeito, as bicicletas elétricas se somam às bicicletas tradicionais em cidades e países há tempos reconhecidos como bike friendly. Na Holanda, por exemplo, a bicicleta está intrinsicamente presente no estilo de vida das pessoas. Em cidades como Roterdã, houve um aumento de 60% no uso da bicicleta nos últimos dez anos. Segundo o estudo de mobilidade anual (Mobiliteitsbeeld) publicado pelo Ministério das Infraestruturas e Meio Ambiente holandês, Amsterdã e Utrecht estão nas primeiras posições em termos do uso deste meio de transporte. Estudos holandeses avaliam que o aumento do ciclismo no país se deve, em parte, ao crescente uso da bicicleta elétrica, com um uso total de 10% da população, especialmente entre as pessoas com idade por volta dos 65 anos. A ministra de Infraestrutura e Meio Ambiente da Holanda, Mélanie Schultz, comentou: “é importante que as pessoas continuem usando bicicleta, mesmo quando idosas”.

É justo, então, creditar às bicicletas elétricas sua colaboração ao fomento da cultura ciclística.

Mas, neste contexto, um problema surgiu. A população maior de 65 anos tem o índice mais elevado de mortalidade em acidentes envolvendo bicicleta. Até setembro de 2014, 184 holandeses perderam a vida em acidentes ciclísticos, sendo 124 destes maiores de 65 anos. Com o objetivo de resolver este problema, o próprio Ministério da Infraestrutura e Meio Ambiente desenvolveu, através do Instituto de pesquisa TNO, uma bicicleta elétrica inteligente, com sensores, câmera traseira e sistema de vibração que avisa o ciclista de perigos iminentes. Um protótipo foi lançado em dezembro de 2014, mas a previsão é que esta e-bike seja lançada em dois anos por um preço em torno de 1.700 a 3.200 euros.

Interessante observar que, mesmo um governo com todo o know-how que a Holanda tem no setor de bicicletas, optou por ter como objeto de pesquisa e desenvolvimento a e-bike tendo em vista o público mais idoso. Estima-se que o país possui 35 mil quilômetros de ciclovias, 17 milhões de habitantes e 18 milhões de bicicletas, sendo que um milhão são elétricas.

Outro exemplo de inclusão da bicicleta elétrica como um impulso à cultura ciclística vem de Madrid, na Espanha. Ao contrário da Holanda, que faz parte da planície do norte da Europa e tem um relevo que não ultrapassa os 50 metros, a capital espanhola possui muitas subidas e descidas. Esse fator foi determinante ao elaborar o projeto de implantação do sistema de bicicletas compartilhadas, levando Madrid a optar pelas elétricas como forma de incentivar mais pessoas ao pedal. O BiciMad, como foi chamado, é o primeiro serviço público de bicicletas elétricas em capitais europeias.

Voltando ao Brasil, em dezembro de 2013 foi publicada no Diário Oficial a Resolução nº 465 do Contran, que equiparou as bicicletas elétricas às bicicletas convencionais, desde que respeitando algumas características. Foi um alento e um incentivo ao mercado brasileiro, que sofria com a indefinição legal do uso do produto, embora a legislação ainda deixe margem para interpretações.

Dentre os veículos elétricos, a bicicleta é, até o momento, o que se estabeleceu de maneira mais concreta. E enquanto ciclista, considerando as variáveis espaço urbano, transporte ativo e sociedade sustentável, que bom que seja assim.

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