Em julho de 2016 foi instalado um contador de ciclistas na cidade de Belo Horizonte (BH), localizado na região Centro-Sul. Assim, resolvi realizar um estudo a partir dessa fonte de informação, verificando como diferentes variáveis poderiam influenciar o comportamento daqueles que usam a bicicleta em BH. A ideia foi desenvolver um modelo estatístico que averiguasse a significância e o impacto das variáveis elencadas.

As variáveis testadas foram:

  1. Natureza climática: Chuva, umidade, insolação e temperatura;
  2. Evolução ao longo do tempo: Anos calendários de 2016, 2017, 2018 e 2019;
  3. Trabalho e Escola: Dia Útil/Aulas x Feriado/Fim de Semana/Férias;
  4. Eventos extraordinários: Greve dos caminhoneiros e Bloco da bicicletinha;
  5. Fim do programa de bicicletas compartilhadas com estações fixas, denominado Bike BH, o qual foi encerrado em 10 de abril de 2019 na região Centro-Sul, depois de funcionar por cinco anos.

Fim do Bike BH

De posse dos resultados, verifiquei que o fim do programa pode ter levado a uma redução próxima de 10% no fluxo diário de ciclistas. Esse número demonstra que de alguma forma o sistema de bicicleta compartilhadas apresentava alguma funcionalidade e representatividade dentro dessa região. Essa triste notícia pode ser visualmente constatada pelo gráfico abaixo.

Como se pode observar, exatamente a partir do encerramento do Bike BH, a média diária cai abaixo do ano de 2018 e até mesmo de 2017 em alguns meses. Somente no final de 2019 é que a média diária volta a crescer e se equiparar com os anos anteriores.

Esse resultado é especialmente lamentável quando se verifica que a tendência anterior era de crescimento. Pelo estudo, verifica-se que o ano de 2017 contribuiu com um aumento de 8,7% em relação ao ano anterior, enquanto 2018 avançou 16% em relação a 2017 e contribuiu 27,5% em relação a 2016. Esse último resultado foi ainda mais empolgante por ter permitido chegar à marca histórica e simbólica de 100 mil ciclistas (100.360 no cômputo final), fato este muito comemorado.

©Cristiano Scarpelli

Trabalho e escola

O resultado referente ao fluxo de ciclistas em dias úteis é de grande valia, pois permite verificar o potencial do uso da bicicleta enquanto opção de mobilidade urbana, conhecimento esse indispensável para o atual cenário de cidades congestionadas e intransitáveis.

Assim, verifiquei que durante os chamados dias úteis, o número de ciclistas a passar no contador aumenta 27,1%. Já durante as férias e recessos escolares, o fluxo de ciclistas diminui perto de 14%.

Logo, ambos resultados indicam que a bicicleta tem sim potencial como alternativa de transporte na cidade de Belo Horizonte, ainda que muitos combatam essa ideia devido ao relevo irregular da cidade.

Eventos extraordinários

Como esperado, os eventos extraordinários contribuem para aumentar consideravelmente o fluxo de ciclistas. O evento carnavalesco denominado Bloco da Bicicletinhaacrescenta até 346 novos ciclistas/dia, um aumento impressionante de 142,3%. Já a greve dos caminhoneiros de 2018 fez a média diária aumentar perto de 25,6%.

©Gil Sotero

Condições climáticas

O indicador denominado de Insolação indica que cada hora de sol pode colocar 1,4% a mais de ciclistas nas ruas. Ou seja, um dia ensolarado de verão com 13 horas de sol pode contribuir com um aumento de mais de 20%.

No caso das temperaturas, a partir dos 14ºC (que foi a menor temperatura média registrada), o número de ciclistas/dia aumenta gradativamente até os 21ºC, quando se observa um acréscimo de 13% no número de ciclistas/dia. A partir daí, à medida que se intensifica o calor, registra-se queda gradativa na disposição das pessoas pedalarem, demonstrando que o calor também é fator de desestímulo.

A umidade relativa do ar também influencia de maneira negativa nos seus extremos. No estudo verifiquei que um tempo seco pode resultar em diminuição de 20% em relação aos melhores dias, que se situa em uma umidade entre 45% e 55%. Vale notar que esses valores coincidem com a faixa recomendada por médicos para atividades esportivas. Por sua vez, o impacto negativo é ainda maior com o tempo úmido, podendo chegar a uma redução média de 60% na opção pelo pedal.

Por último, verifiquei que isoladamente cada milímetro de chuva diminui o fluxo de ciclistas em 0,5%. Todavia, como dias chuvosos necessariamente são acompanhados de alta umidade, é recomendável a análise das duas em conjunto. Dessa forma, um dia mais úmido e com fortes pancadas de chuva pode resultar em decréscimos no número de ciclistas maiores do que 70%.

©Vinicius Túlio

Portanto, percebe-se que os resultados climáticos confirmam muitas percepções que nós ciclistas já temos no dia a dia, especialmente no que se refere às chuvas. A grande vantagem é ter agora parâmetros numéricos para aferir o impacto do que normalmente era apenas intuitivo.

Ao fim, espero que os resultados aqui apresentados tenham sido interessantes e possam servir de inspiração e subsídio para outros estudos e projetos, seja de autoridades governamentais, gestores ou movimentos da sociedade civil.

Para mais informações e uma apresentação em vídeo dos resultados seguem os links:

Resultados gerais:

Variáveis climáticas:

©Cristiano Scarpelli