Utilizámos a Turbo Como 3.0 Low Entry durante alguns dias, incluindo uma viagem de mais de 80 km, entre Lisboa, Cascais e regresso. Aqui fica a nossa experiência.

Quando falamos de bicicletas elétricas, os desafios em termos de engenharia são grandes. Os componentes adicionais, como o motor e a bateria, são pesados e ocupam espaço. Num projeto mais preocupado com o preço, a integração destes elementos é feita de forma simples e, normalmente, pouco elegante. Se quanto ao motor, próximo ou integrado na roda pedaleira, é mais fácil encontrar soluções, o mesmo não pode ser dito da bateria.

Esta é muitas vezes colocada sobre a roda traseira, por baixo de uma base para transporte de objetos. Em termos de distribuição de pesos, sobretudo no que toca ao centro de gravidade, está longe de ser uma solução ideal. Mas é prática e económica, permitindo utilizar quadros convencionais para construir bicicletas electrificadas.

Outra solução também popular é colocar a bateria acoplada ao quadro, com maior ou menor integração. Continua, na maior parte dos casos, a ser um acrescento.

Specialized optou pela integração total, desenhando um quadro específico para as suas elétricas. Desta forma, não só o resultado é esteticamente superior, como toda a estrutura é preparada para resistir a forças diferentes daquelas a que uma bicicleta não elétrica está sujeita.

Confortável e… pesada

A Como Turbo — todas as Specialized elétricas têm a designação Turbo — é uma bicicleta urbana, nesta caso, com um quadro misto. Não tem qualquer veleidade desportiva. O objetivo é que seja o mais confortável e segura possível. Uma bicicleta pesada e embora a Specialized não divulga o peso das suas bicicletas, este exemplar não pesa menos de 22/24 kg.

O motor tem uma potência de 250 W, o que classifica esta bicicleta como uma pedelec. Tal significa que o motor só funciona quando pedalamos, trabalhando em conjunto com o esforço do ciclista. Ou seja, não anda sozinha. Além disso, a assistência funciona só até aos 25 km/h. Claro que a bicicleta anda mais depressa, mas a partir daí, o ciclista está por sua conta. Os eletrões não ajuda.

Do ponto de vista mecânico, está equipada com um prato de 40 dentes e uma cassete traseira Shimano CS-HG200 com nove velocidades (11-36). A assistência elétrica tem três níveis, sendo que o primeiro acrescenta 30% ao esforço do ciclista. O segundo, 100% e o terceiro, 300%.

O alcance da assistência é de cerca de 100 km com a carga completa, mas tal depende do nível de assistência a que recorremos, bem como o percurso que escolhemos.

A bateria tem 460 Wh de capacidade. Numa ficha doméstica, carregou de 0 a 100% em 5h15 minutos. Pode ser removida do quadro, com uma chave especial.

Os travões de disco Shimano BR-MT200 têm comando hidráulico. À frente com um diâmetro de 180 mm, atrás, de 160 mm. São eficientes e transmitem segurança, exibindo ainda uma constância de funcionamento positiva.

Rumo à Glória… eletrificada…

Antes do arranque, convém caraterizar o ciclista. Trata-se de um utilizador francamente ocasional, de meia idade, cujas voltas em bicicletas convencionais não costumam ter extensões superiores a 30 ou 40 km. Foi assim com alguma curiosidade que arranquei, pela manhã de um sábado, do Paço do Lumiar rumo à Baixa, para me familiarizar com a Como Turbo. O pequeno mostrador digital indicava 95% de carga.

É fácil encontrar uma posição confortável, de costas direitas. Sente-se o peso e as dimensões da bicicleta quando a manobramos. Mas com a assistência no nível 1, rapidamente percebemos que os eletrões estão do nosso lado. Depois de atravessar Telheiras, fui sempre pela ciclovia até aos Restauradores. A Specialized confere grande confiança e cheguei lá muito rapidamente, sem qualquer sinal de cansaço ou desconforto.

Por graça, lembrei-me da Calçada da Glória, que nunca subi de bicicleta. São apenas 230 metros, mas em empedrado e com uma inclinação (16%) que não está ao meu alcance. Existe uma competição chamada a Subida à Glória e é uma prova de esforço reservada a campeões. Pelo menos, para fazer boa figura. O recorde é de 42 segundos, mas mesmo em três minutos é um bom desafio.

Achei que era uma boa forma de experimentar a potência máxima da Como, que no nível 3 disponibiliza três vezes a força que eu fizer nos pedais. Mesmo com toda essa ajuda, não foi fácil, com o empedrado e alguns turistas a aumentarem o nível de dificuldade. Cheguei lá acima, às escadas da Rua da Misericórdia, sem fôlego. Mas quando analisei o meu percurso no Strava, descobri que tinha feito, naquela plataforma, o segundo melhor tempo do ano (agora é o 11º) e o 126º melhor desde que há registo, com 1m31s…

Vamos a Cascais

Desci ao Cais do Sodré e decidi ir até Cascais, só porque sim. Usei a ciclovia sempre que possível até Algés. Não é fácil, pela quantidade de peões que insistem em usar a ciclovia para passear ou correr, sobretudo quando queremos manter um certo ritmo. No meu caso, tentei andar sempre no ponto óptimo dos 23-25 km/h, com o nível mais baixo de assistência.

Os troços separados da ciclovia são difíceis de navegar e em Carcavelos acabei por optar por ir pela Estrada Marginal. Vi algumas bicicletas a circular no passeio e rapidamente percebi que é uma solução muito mais segura. Tenho alguma experiência a rodar junto dos automóveis, mas nunca deixa de me surpreender a falta de cuidado que os automobilistas têm para com os ciclistas. Para além das razias provocadas pela impaciência, existem os idiotas que apitam quando passam por nós, numa atitude perigosa e covarde, de quem vai protegido na sua armadura com rodas.

É mesmo urgente que existam alternativas a esta situação. Este passeio foi uma boa chamada de atenção para esta situação grave que enfrentam todos aqueles que utilizam a bicicleta regularmente.

Continuei pela Marginal até ao centro de Cascais, sem sobressaltos de maior. Eram quase horas para almoçar e já tinha feito 40 quilómetros. A autonomia indicada era de quase 50 km, suficiente para voltar até casa.

Regresso via Monsanto

Após o almoço, regressei pela Marginal até Algés. Tive os mesmos problemas com os automobilistas que provocam mais desgaste do que a pedalada assistida na Como. Ainda tinha autonomia folgada para chegar a casa, pelo que decidi subir até Monsanto e descer para Benfica.

Na subida, apanhei dois ciclistas nas suas bicicletas de montanha. Ao princípio, ficaram surpreendidos com a facilidade com que os apanhei e acompanhei na minha “pasteleira”. Continuei na roda deles, mas depois continuei a subir até às antenas. Após mais de 50 km, já estava a ficar um pouco cansado e recorri ao modo 2 da assistência. Ajudou bastante a manter o ritmo na subida, mas também teve consequências no alcance. Comecei a ficar com um valor à conta para regressar a casa. Fui até XX e ali apanhei a ciclovia rumo ao Campo Grande. Notei que cada vez precisava de fazer um esforço maior progredir. Quando cheguei ao pé do Colégio Alemão, apesar de ainda indicar 6%, percebi que estava entregue a mim próprio. Faltavam seis quilómetros para o destino…

Chegada em esforço

A transmissão da Como Turbo 3.0 é pouco versátil, com reduzida amplitude, sobretudo quando falamos de uma bicicleta tão pesada. É natural, porque está feita para trabalhar em conjunto com a assistência do motor elétrico. Quando acaba a energia, fica tudo mais difícil. Se em plano, o progresso é razoável, nas subidas, o caso muda de figura. Na última subida mais prolongada, tive mesmo que desmontar e empurrar algumas centenas de metros.

À chegada, tinha percorrido 82 quilómetros, sendo que os últimos seis custaram provavelmente mais do que os 76 anteriores. O acumulado total foi de quase 850 metros. Estivemos em movimento 4h50, com uma média de 16,9 km/h. A velocidade máxima registada foi de 61,6 km/h, a descer Monsanto rumo à radial de Benfica.

Foi um teste duro, mas muito interessante, que permitiu tirar algumas conclusões.

A primeira é que, se existirem poucas inclinações e se usar o nível mais baixo de assistência, esta bicicleta pode, de facto, ter um alcance elétrico de 100 km. A segunda é que é uma bicicleta apta a fazer deslocações suburbanas. Mais do que passear, consegue viajar-se a um ritmo razoável e com segurança e conforto.

A terceira é que uma vez utilizada a carga da bateria, a Como fica com uma utilização muito limitada, fruto do peso e da transmissão.

Balanço Final

Esta bicicleta elétrica da Specialized é uma solução de transporte urbano de qualidade. Confortável e segura, tem dimensões consideráveis, que a tornam menos ágil do que gostaria. Não sou grande fã dos quadros de entrada baixa. Mas admito que, perto do fim da viagem, fiquei satisfeito por não ter que subir a perna sobre o quadro de cada vez que parei.

A bateria carrega depressa numa ficha doméstica. Pude confirmar 5h15 desde zero até os 100%.

O preço da Specialized Como Turbo 3.0 é de 2699 euros. Existem versões mais dispendiosas e com um desempenho superior. Pode consultar a gama completa da marca americana em Portugal aqui. Mas para percursos em cidade ou mesmo suburbanos, esta versão mostrou-se bastante adequada.

Tendo em conta a qualidade geral deste produto e as suas competências, é notória a diferença para outros produtos mais acessíveis, pelo que a minha avaliação é muito positiva.