Conheça a História de Nadir Ávila, um alfaiate apaixonado por Bicicletas, que criou a primeira marca de Roupas de Ciclismo do Brasil, e um mercado inexistente antes da Biene.

Hoje em dia é fácil encontrar uma Roupa de Ciclismo no Brasil, basta ir à uma bicicletaria ou acessar a internet, colocar no Google uma palavra-chave e lá estarão zilhões de opções. Mas há 44 anos praticamente não existia nenhuma bicicletaria que vendesse algo assim, acredite. Com exceção da Bicicletaria Eduardo, do sr. Eduardo Puertollano, um ex ciclista que trazia alguma coisa da Argentina, as bicicletarias eram aqueles lugares cheios de pneus e bicicletas pendurados e uma oficina cheia de graxa nas paredes. Foi nesse cenário que o sr. Nadir Ávila, um alfaiate e confeccionista paranaense vivendo em São Paulo há mais de 30 anos, teve a ideia de fabricar comercialmente um produto inexistente no mercado brasileiro e criar um mercado inexistente no Brasil. Assim nascia a Biene, a primeira marca especializada em Roupas de Ciclismo.

Nadir Ávila, posicionando o molde de uma Jersey de Lã em 1977, no Bom Retiro, onde sempre apareciam ciclistas da Caloi e Pirelli, praticamente todos os dias.
Nadir Ávila, posicionando o molde de uma Jersey de Lã em 1977, no Bom Retiro, onde sempre apareciam ciclistas da Caloi e Pirelli, praticamente todos os dias. © Cícero Ávila

“- Na falta de quem fizesse a Caloi fazia qualquer coisa improvisada. A Primeira Marca de Roupa de Ciclismo de verdade no Brasil, começou com a Biene. Antes do Nadir, não tinha nada”. Antônio C. Alves (Biskuy)

Tendo se mudado com sua família para o Residencial Parque Continental em 1972, perto da USP, não havia muita coisa a se fazer nos finais de semana. E foi pedalando numa Gazelle, comprada em Osasco, que o sr. Nadir Ávila mudaria os rumos de sua confecção de roupas, ao avistar na USP 3 ciclistas usando aquelas camisas de lã bordadas e os calções de lã com um forro de pele natural, sem espuma. Perguntou onde poderia comprar aquilo e obteve como resposta um “- Isso não existe no Brasil, veio da Italia, aqui ninguém é capaz de fazer algo assim”. Mesmo assim, pegou a roupa “emprestada” e virou o bairro do Bom Retiro para conseguir tecer as malhas. Usou seus dons de alfaiate para reproduzir aquela roupa “que ninguém faria no Brasil” sem passar a tesoura nela. Pouco depois, na USP, vendeu todos os calções e camisas que levou consigo. Ali, nascia a Biene em 1974.

“- Seu Nadir, trouxe esse calção de lycra todo torto lá da Bélgica, é o que todo o mundo está usando hoje lá fora (1979). O senhor consegue fazer um para mim? Pode lançar que eu assino embaixo”. – José Carlos de Lima, Ciclista da Caloi

Pouco depois, o técnico da Caloi, Juan Timón, apareceu no nº 263 da Rua Três Rios com os ciclistas da Caloi para experimentar os uniformes. A Biene seria por 2 décadas e meia fornecedora oficial da Caloi, Pirelli e muitas outra equipes. Algumas bicicletarias passaram a ser clientes fiéis dessas roupas que “não venderiam nunca”. Em 1977 a Casa Bayard Esporte foi a primeira rede de lojas a vender roupas da Biene. E não parou por aí. A amizade com grandes ciclistas da Caloi fazia um intercâmbio com as novidades tão raras, vindas da Europa. Foi assim que, em 1978, apareceu na Biene a primeira Bermuda de Lycra, trazida da Bélgica. Na temporada seguinte, a Caloi apareceu com bermudas de Lycra, lançada pela Biene. Em 1982, a bermuda com alças. O sr. Nadir fez as primeiras de encomenda para os meninos da Caloi e, na brincadeira, perguntou o nome “daquilo”. Nascia ali o Bretelli, numa brincadeira para batizar a peça.

“- Sei lá o nome disso seu Nadir, chama de Bretelli, que em italiano significa duas alças”. – José Carlos de Lima, Ciclista da Caloi

Em 1982 também apareceram as primeiras camisas, feitas de Lycra. Mas a Biene ficou mesmo conhecida quando anunciou na revista Bicisport em 1985. Tornou-se uma marca reconhecida nacionalmente e atendeu ciclistas que até hoje lembram-se da marca.

Durante os anos 1990, o sr. Nadir teve a honra de vestir ninguém menos que Eddy Merckx em sua breve passagem pelo Brasil, no lançamento da Caloi By Eddy Merckx.

Infelizmente a Biene passou por diversos problemas internos e ficou inativa após o Plano Collor. Felizmente foi reativada em 2006, por mim, filho do sr. Nadir, que me passou tudo o que sabia, ao longo de 30 anos. A última aparição pública do sr. Nadir foi na homenagem a ele prestada no Giro Vecchio, do Paulinho de Tarso, pouco antes de falecer, aos 87 anos de idade. O legado do sr. Nadir continua hoje pelas minhas mãos, mas o mercado que ele criou cresceu enormemente, marcas apareceram e desapareceram sem deixar vestígios, porém a Biene ainda hoje possui alguns apaixonados que guardam roupas antigas como se fossem relíquias. Talvez o sr. Nadir tenha falecido sem sequer notar a importância que teve na História do Ciclismo Brasileiro, mas existem pessoas do meio que têm imenso respeito pelo seu feito, afinal, como diz o velho ditado, “depois que o Colombo bota um ovo em pé, aí fica fácil.