Um designer e um dono de restaurante de Caxias do Sul (RS) vão participar, a partir de 15 de junho, do Race Across America, prova de ciclismo que parte de Oceanside, na Califórnia, e atravessa cerca de 4.800 quilômetros de subidas e descidas por 12 estados até chegar a Anápolis, em Maryland. Dois caras comuns, com profissões comuns, que enfrentarão um desafio sobre-humano, se alternando em cima da bicicleta por nove dias enquanto vencem cordilheiras como as de Serra Nevada, Apalaches e Montanhas Rochosas e longos rios e planícies.

O mais impressionante é que um deles, o designer Tiago Fiamenghi, há quatro anos mal aguentava vencer os 2,5 km do percurso da sua casa até o trabalho. Um dia, soube que o dono do restaurante onde costumava almoçar, César Mincato, havia pedalado 220 km da Caxias do Sul até as praias de Torres e que pretendia fazer os cerca de mil quilômetros até Montevidéu, no Uruguai. Resolveu embarcar no desafio.

– Na primeira pedalada juntos, treinando, foi de apenas 19 km e eu achei que ia morrer. Vi que precisava mesmo de treino e dedicação. Resolvemos criar um projeto e foi assim que surgiu a Bike & Wine, porque os papos sobre o assunto foram tomando vinho no restaurante do César. Nós nos dedicamos e fizemos a viagem ao Uruguai em fevereiro de 2017. Imaginávamos dias tranquilos de sol, pegamos tempestades em estradas de trânsito intenso. Foram dez dias pedalando cerca de oito horas diárias, quase um estado meditativo. A gente brinca que quem saiu de Caxias do Sul não voltou, porque foi uma experiência de transformação – conta Tiago.

César e Tiago enfrentaram chuva forte na viagem de bicicleta para o Uruguai, em 2017 © Divulgação / Andreia Fadanelli

Apesar do nome, a dupla Bike & Wine não abusa do vinho durante as pedaladas. Em Montevidéu, houve espaço para visitar uma vinícola no caminho e duas ao chegar ao destino final. Nos Estados Unidos, eles não terão tempo para distrações durante a prova. Mas pretendem comemorar com um brinde quando encerrarem o Race Across America, que vai resultar em um documentário e em um livro.

Nos últimos dias de preparação, eles têm feito treinos direcionados e estão estudando e reestudando os caminhos. Contam que usam as ferramentas do app Strava para monitorar pessoas que já fizeram a prova, pesquisar os tempos delas em cada trecho, as marcações de altimetria, tudo para evitar esforço excessivo em alguns pontos ou lentidão demais em outros.

Dupla Bike & Wine: registro, no Strava, de um dia de viagem para o Uruguai, em 2017 © Reprodução / Strava


Nessa prova, um ciclista sozinho tem 12 dias para cruzar os Estados Unidos da Costa Oeste à Costa Leste. Já os grupos, que podem ser duplas como Tiago e César, quartetos ou octetos, sempre em esquema de revezamento, podem completar o percurso em até nove dias. Tiago explica que enquanto um estiver pedalando, o outro estará descansando na van que vai acompanhá-los com uma equipe de nove pessoas, que inclui o técnico, motorista, navegador, film maker, massagista e fisioterapeuta, entre outros. Todos voluntários, com exceção do chef de cozinha, contratado.

– Foram dois anos de preparação, mais de 720 dias de projeto. Não são só os nove dias da prova. E não foi fácil, porque cada um de nós tem família, trabalho, boletos. Nenhum de nós é rico, não está sendo fácil levantar o dinheiro necessário. Tem que ter comida para 11 pessoas, tem que ter suplementos para a gente. Nós já arrecadamos o básico para alugar três vans, mas não teríamos nem onde dormir direito, estamos fazendo uma vaquinha online. Se chegarmos a R$ 200 mil, alugaremos um motor home – conta Tiago, 35 anos.

Faltam pouco mais do que R$ 40 mil para o objetivo ser alcançado. Mas com ou sem motor home, eles vão encarar o desafio, na cara e na coragem – e muita força nas pernas.

– A vida é muito rápida, a gente tem que tirar os sonhos da gaveta. Essa prova tem a ver com autoconhecimento, com saber os próprios limites. É o nosso Everest – diz César, 52 anos, sem esconder a ansiedade. – A gente volta totalmente diferente de uma aventura dessas.

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