Em 9 dias, pedalei 747 km, com 13.219 metros de subidas acumuladas, entre a cidade catarinense de Navegantes e Gramado, no estado gaúcho.

Guia de Trilhas Serra Geral (BluGrama) – a inspiração

No início de 2013 adquiri o guia BluGrama, da editora Kalapalo, de autoria de Guilherme Cavallari, que mapeia um percurso de Blumenau a Gramado para ser percorrido em bicicleta. Este foi o despertar para esta cicloviagem. A leitura completa deste guia, aliada a meu conhecimento da região sul, me ajudou a dar início ao planejamento: cidades pelas quais passaria, distâncias e altimetria de cada percurso etc. Além disso, tinha o objetivo de aproveitar a oportunidade para descer a Serra do Corvo Branco e subir a Serra do Rio do Rastro, ambas em Santa Catarina, colocando um pouco mais de aventura no roteiro.

Planejamento

Agosto foi o mês escolhido, por ser final de inverno, apresentar temperatura amena e menor incidência de chuva em comparação a outras épocas do ano, favorecendo assim a condição das estradas e reduzindo o desgaste físico (pelo menos na teoria!). Porém, na realidade me deparei com temperatura média oscilando entre 25°C e 30°C.

Comecei então a pensar no que levar para esta que seria minha maior cicloviagem e, ainda por cima, sozinho. Eis a dúvida: alforje ou mochila? Bagageiro e alforje iriam diminuir a agilidade da bicicleta, teria carga sobre “a magrela”, por outro lado, mochila nas costas poderia ser desconfortável e não caberia tudo o que eu precisava levar. Mas o que levar? Foi aí que fiz um check list e em seguida, testei se todos os itens caberiam na mochila de 22 litros. Couberam! Optei pela mochila. Além desta também levei uma pochete para a carteira, jogo de ferramentas, canivete e uma câmara de ar (fácil acesso).

É importante mencionar que devemos considerar imprevistos no planejamento de uma viagem, tendo sempre um plano B para momentos como este. Por exemplo, ao desembarcar no aeroporto de Navegantes, fui direto para a agência dos Correios despachar minha malabike para Porto Alegre, onde pegaria novamente o avião para voltar para casa. Embora só fosse descobrir no final do pedal, tive aí meu primeiro imprevisto: a malabike chegou com cinco dias de atraso.

© Jessie Heleno Chimachi

Apesar de ter planejado a viagem para cumprir em 10 dias, conclui o cronograma em nove dias, com um percurso total de 747 km e altimetria acumulada de 13.219 m. O trecho de Aurora – SC ao Cânion Monte Negro – RS foi a parte mais difícil. O percurso possui muitas paisagens únicas e proporcionou momentos inusitados, como um encontro com a Maria-Fumaça, na região de Apiúna.

Percorri todo o caminho sem problemas mecânicos e nenhum pneu furado, 90% do traçado foi por estradas de terra, passando por fazendas e diversas comunidades, sendo que as que mais me impressionaram foram:

Parque Nacional da Serra do Itajaí (criado em 2004) – Possui inúmeras nascentes e rios de águas cristalinas. Antes da criação do Parque, existia uma comunidade chamada Faxinal do Beppe. Após a retirada e indenização das famílias locais, todas as casas ficaram abandonadas e o pedal neste dia foi muito solitário, passando a sensação de uma “cidade fantasma”.

Serra do Corvo Branco: a lendária estrada, que foi a ligação entre o litoral e a serra, une diretamente Urubici a Grão Pará. Apesar de ela ter trechos interditados para obras, continua em atividade. Seu ponto de início se assemelha a uma verdadeira “garganta”, já que a serra começa no meio de dois paredões de pedra com mais de 90 m de altura e fica a 27 km do centro de Urubici. No caso de chuva, a aventura fica ainda mais perigosa, pois devido às obras, todo o terreno está mexido, proporcionando doses extras de emoções aos mais aventureiros.

Canion Monte Negro. © Jessie Heleno Chimachi

Serra do Rio do Rastro, de Lauro Muller (Guatá) a Bom Jardim da Serra. É um dos cartões postais do estado de Santa Catarina, com mais de 1.421 m de altitude, caracterizada por subida íngreme e curvas fechadas. Em 2012 foi eleita uma das estradas mais espetaculares do mundo, por um site espanhol.

Cânion Monte Negro, região que pertence ao município de São José dos Ausentes – RS e dista 43 km do centro da pequena cidade, tem como único acesso a estrada da Silveira. É o ponto mais alto do estado do Rio Grande do Sul, a 1.403 m do nível do mar. É possível chegar próximo ao pico de carro, moto, pedalando, a cavalo, o que facilita a caminhada nas bordas do cânion permitindo uma vista deslumbrante de toda a região montanhosa.

Passo do S: localizado a 38 km do centro de Cambará do Sul, já no município de Jaquirana. A estrada corta o rio Tainha (sem ponte) sobre um lajeado de rochas de 80 m de extensão. Quando o rio está em seu nível normal é possível atravessá-lo de bicicleta (desmontado), porém, com muita cautela e observando o sinalizador.

Destaco que para qualquer cicloviagem nunca se deve usar apenas uma fonte de informação. Nem todos os tracks que estão disponíveis na internet estão isentos de erros ou falhas. O guia BluGrama foi de suma importância, pois as informações ali contidas eram confiáveis e sempre fornecia referências, às quais me apoiava em momentos de dúvida. Era só conversar com os moradores locais, mencionando tais pontos, que a conversa e as informações fluíam. Apesar da tecnologia, o guia foi o material de consulta mais relevante nesta cicloviagem, por trazer informações como mapas, planilhas de orientação, distâncias, altimetrias, dificuldades físicas e técnicas, hospedagens, entre outras.

Esse foi o maior desafio que já enfrentei de bicicleta, tanto pela distância e altimetria acumulada, quanto pelo fato de estar sozinho e sem nenhum tipo de apoio. Mas foi também uma experiência única, especialmente pelos momentos de reflexão e autoconhecimento.

Serra do Rio do Rastro. © Jessie Heleno Chimachi

Check list da cicloviagem

Equipamentos e ferramentas
Bicicleta, malabike, mochila 22 l, 2 câmeras de ar, 1 power link, óleo lubrificante, kit remendos, 2 proteções de freios a disco, 1 bomba de ar, 1 canivete, jogo de ferramentas, 1 limpa corrente (escova de dente), 1 pinça (retira espinhos), chave de boca (pedal), gancheira, cabo de marcha, farol / bateria / carregador, GPS / carregador / cabo e 1 caneta.

Vestuário para pedalar
2 camisas bike – manga longa, 2 breteles, 2 pares de meias, 1 corta-vento, 1 capacete, 1 par de luva, óculos de sol, pernito, sapatilha e pochete.

Hidratação
1 garrafa de água 500 ml e BCAA.

Higiene
Pasta de dente, escova de dente, minishampoo, minisabonetes, fio dental, bloqueador solar, roupa para viagem – avião, 1 calça, 1 camiseta, 1 meia, 1 roupa íntima e 1 tênis.

Documentos
Identidade, cartões de crédito, dinheiro e passagens aéreas.

Eletrônicos
Celular / carregador e máquina fotográfica.

Para hospedagem
1 camisa, 1 bermuda, 1 roupa íntima e 1 par de chinelo.

© Jessie Heleno Chimachi

O trajeto ficou assim

Navegantes
Blumenau
Apiúna
Ibirama
Rio do Sul
Aurora
Ituporanga
Petrolândia
Rio Rufino
Urubici
Serra do Corvo Branco
Guatá
Serra do Rio do Rastro
Bom Jardim da Serra
Cânion Monte Negro
São José dos Ausentes
Cambará do Sul
São Francisco de Paula
Gramado

Equipamentos utilizados

Bike
Trek Superfly Full Suspension AL 100 – ano 2012 – 30v
Malabike
Flexível de fabricação própria
GPS
Garmim EDGE 800
Guia
BluGrama – Editora Kalapalo
Mochila
22 L com capa de chuva
Pochete

Serra do Corvo Branco. © Jessie Heleno Chimachi