Fazer turismo pela Europa passando pelas cidades mais famosas sempre foi o desejo de todo o brasileiro. Mas alguém já pensou em explorar o interior dos países europeus e conhecer um lado um pouco menos turístico e bem mais pitoresco?

Esta é uma das diversas motivações que levam pessoas comuns a cruzar diversos quilômetros sobre bicicletas. E foi pensando na realização de um cicloturismo no Velho Continente que eu (Rafael), minha esposa Andrea Pandolfo, e um casal de amigos – Júlio Rosa e Karine Pickbrenner – resolvemos encarar seis dias e cerca de 380 km em um caminho conhecido como Greenways Trail, que liga Praga a Viena.

Pedalamos dentro das regiões da Boêmia e da Morávia. É importante dizer que a Boêmia apresenta cervejas de excelente padrão mundial, prontas para serem degustadas durante o passeio: em todas as cidades onde nos hospedamos havia uma cervejaria local. Já a região da Morávia se orgulha pelos belos parreirais e vinhos de ótima qualidade oferecidos pelo caminho juntamente com uma diversidade de queijos simplesmente inacreditável. Por fim, ainda tivemos a oportunidade de conhecer uma bebida muito degustada na Morávia, chamada de Burcák. Para os leigos como nós, trata-se de um vinho jovem, a partir do mosto, com adição de açúcar e fermentação, o qual se parece com uma espumante não filtrada.

Trata-se de um passeio predominantemente pelo sul da República Tcheca cruzando as cidades de Cèsky Krumlov, Trebon, Telc, Vranov, Znojmo, Mikulov e Mistelbach, já no norte da Áustria, sem falar nas dezenas de vilarejos e surpresas que tivemos pelo caminho. O passeio privilegia rotas de menor movimento, parques e reservas. As rotas demonstraram estar muito bem sinalizadas e marcadas, porém, a língua tcheca dificultou um pouco o entendimento de algumas sinalizações. A marcação utilizando cores acabou sendo de grande serventia para a navegação do grupo.

Tais regiões ainda conservam muito da arquitetura medieval, ou seja, cidades muradas e castelos imponentes que chamam a atenção por este diferencial. Além do mais, como os centros históricos das cidades não possuem extensas dimensões, tais atrações podem ser conhecidas numa boa caminhada de duas a três horas, ou até mesmo de bicicleta, para quem ainda estiver com ânimo de se manter sentado numa magrela após um dia todo de pedal.

Para realizar este passeio contratamos uma empresa, a AVE Travel (http://www.bicycle-tours.cz/), que além de cuidar de toda a hospedagem durante o caminho, nos disponibilizou as bicicletas e todos os acessórios mínimos para garantir um bom passeio (mapas, GPS com as rotas, capacetes, itinerários com descrição da rota com paradouros e altimetria, kit completo de consertos, alforjes e translado das malas). Além disso, a agência teve o cuidado de evitar que pedalássemos dentro dos grandes centros urbanos, ou seja, fomos pegos em Praga e estavam a nossa espera antes de entrarmos em Viena. Assim pudemos desfrutar as vias mais calmas, evitando o tráfego pesado próximo às grandes cidades.

Césky a Trebon

Cèsky Krumlov a Trebon

66,6 km e 820 metros de altimetria

Partimos de Cèsky Krumlov, uma cidade patrimônio da UNESCO que, depois de Praga, é a mais visitada da República Tcheca. A cidade pede uma caminhada para conhecer o castelo e seus jardins. Passamos por cidadezinhas muito bonitas, complementadas por caminhos sensacionais até chegarmos em Trebon, cidade datada de 1379. Embaixo do pórtico de acesso à cidade, tomamos um cálice de vinho com outros ciclistas tchecos em uma vinoteca que é um point dos ciclistas locais. Também experimentamos a cerveja da cidade: a Regent.

Trebon a Telc

81 km e 1.020 metros de altimetria

Apesar de ser um dia de pedalada mais longa, os primeiros 20 km são bem planos. Passamos por muitos parques e reservas, e a grande surpresa da viagem foram as centenas de macieiras carregadas que cruzamos pela beira das estradas. O lanche estava sempre garantido.

Trebon a Telc

Telc a Vranov nad Dyji

61,7 km e 690 metros de altimetria

Foi um dia cansativo, pois tomamos muita chuva no caminho, mas o mau tempo foi compensado pelas belas paisagens com castelos e com a passagem por uma lagoa criada pela represa que proporcionou uma bela paisagem de montanhas e lagoas se alternando.

Vranov a Znojmo

Vranov nad Dyji a Znojmo

42,9 km e 690 metros de altimetria

Foi o ponto alto do passeio. Exploramos de bicicleta a cidade de Vranov e seu castelo com vista para toda a cidade antes de pegarmos a estrada. Durante o caminho, quando começamos a beirar a fronteira com a Áustria, tivemos a oportunidade de entrar em um parque binacional (República Tcheca e Áustria). Do topo de um morro dentro do parque era possível ver a fronteira com a Áustria. Logo depois, nos deparamos com uma espécie de paragem para os ciclistas que cruzam por ali, onde se podia degustar vinhos produzidos na região. Ali, no meio dos parreirais, os ciclistas descansam e ficam por um longo período curtindo o lugar e conversando. Seguimos para Znojmo, onde nos deparamos com a festa anual do vinho, que ocorria no centro histórico. A cidade inteira estava lá e tivemos a chance de ver vários espetáculos teatrais e musicais, além de degustações de cervejas, vinhos e burcáks acompanhados de diversos pratos típicos da região, com destaque para os queijos.

Telc a Vranov

Znojmo a Mikulov

79,3 km e 410 metros de altimetria

Neste que foi o trecho mais plano do passeio, deixamos de avistar os diversos castelos e vilarejos caracteristicamente medievais e encontramos uma paisagem mais rural e monótona, com a predominância de parreirais e macieiras. Em razão disso, imprimimos um ritmo mais forte e chegamos cedo em Mikulov, com bastante tempo para conhecê-la. Destaque especial para a vinícola Vinný Sklep U Hrdlickyku, à beira de uma montanha com vista para toda a cidade, com vinhos deliciosos e um queijo camembert prensado simplesmente espetacular.

Telc a Vranov

Mikulov a Mistelbach

47 km e 570 metros de altimetria

Ao cruzar a fronteira entre a República Tcheca e a Áustria, deixamos as curiosas palavras tchecas para nos depararmos com o alemão que apesar de ser uma língua bem complicada, não deixa de ser algo mais familiar. A paisagem se modificou bastante, pois começamos a passar por dentro de parques eólicos.

Todavia, as macieiras não nos abandonaram e continuamos tendo a maçã em nossa dieta durante a pedalada. A pedalada deste último dia, em um trecho mais curto e rápido, terminou com um piquenique acompanhado de mais um vinho tcheco para celebrar o término de mais esta aventura.