Fomos em um grupo de 22 ciclistas, entre eles dois guias e um médico – na verdade um estudante de medicina. Atravessamos o deserto da Jordânia de norte a sul, percorrendo cânions, nadando no Mar Morto, visitando a cidade “perdida” de Petra, conhecendo a vida e a cultura dos beduínos e acampando no deserto. Tudo em cima da bicicleta e não de camelo, como fariam muitos na Jordânia. Foram onze dias de viagem e sete etapas em cima do selim; pedalamos aproximadamente 300 km (90% em cascalho/ areia e 10% em asfalto), alcançando 4.600 metros de ascensão total.

A aventura já começou no aeroporto de Zurique, onde nos encontramos em meio a um caos desmontando e colocando as bicicletas nas caixas antes do embarque. O check in até que foi tranquilo, o nosso maior medo era o excesso de peso. Cada um tem direito a 20 quilos (bicicleta + mala).
O voo partiu de Zurique às 13h30min; chegamos a Amman, a capital da Jordânia, aproximadamente às 18h30min. No aeroporto fomos recebidos pelo Hanna, o agente local que chefia a equipe de apoio para a nossa pedalada. Do aeroporto seguimos direto ao hotel, na cidade de Madaba. Logo depois do jantar montamos as bicicletas para partir cedo na manhã seguinte.

Dividimos o grupo em dois. Thomas, o outro guia, seguia sempre com o primeiro grupo (mais forte) e eu com o segundo (mais fraco), na companhia do médico. Eu costumava começar com o meu grupo meia hora depois da partida do grupo do Thomas.
1º dia – Madaba – Mar Morto
Iniciamos a pedalada às 8h30min. Visitamos a igreja ortodoxa St. Georg, que possui antigos mosaicos do século VI: o principal é um mapa da Palestina com Jerusalém. Pedalamos por uma região desértica e avistamos diversos rebanhos de ovelhas, camelos e seus pastores; alguns deles andavam a pé, de mula ou mesmo de pick-up. É a tecnologia e a comodidade chegando aos lugares mais remotos de nosso planeta! Ao mesmo tempo é contraditório, porque eles sobrevivem com muito pouco. Faz a gente pensar um pouco sobre o nosso estilo de vida.
Nossa primeira parada, a 710 metros de altura, é no Monte Nebo com vista para o Mar Morto e para a cidade de Jericó. Em bons dias é possível avistar Jerusalém, o que não foi o nosso caso. Foi desse monte, segundo a Bíblia, que Moisés avistou a Terra Prometida.

Continuamos a descida em direção ao Mar Morto por um terreno bastante arenoso até chegarmos ao nosso hotel, que fica a – 355 metros de altura, às margens do mar e com temperatura acima dos 40 ºC. Trocamos rapidamente de roupa e, de ônibus, seguimos a Al Mujib para fazer uma caminhada dentro de uma garganta por onde corre um rio. As paredes que sobem até cem metros de altura vão se estreitando pouco a pouco e o ambiente vai escurecendo.
Mais tarde retornamos ao hotel. Hora de nadar, ou melhor, boiar no Mar Morto que está a 410 metros abaixo do nível do mar. Que sensação diferente e estranha.
Até a metade dos anos setenta ainda viviam microorganismos na água, mas devido ao aumento da quantidade de sal nem estes sobreviveram. O aumento de sal deve-se tanto aos vários canais de irrigação que foram construídos para retirar água do rio Jordão, que abastece com água doce o Mar Morto, quanto à evaporação causada pelo sol. Pesquisas afirmam que o mar desce aproximadamente um metro a cada ano.

2° dia – Mar Morto – Al Karak
A pedalada deste dia foi uma experiência diferente para mim, pois o deserto às vezes não tem estradas ou trilhas; você cria o seu caminho com a ajuda do GPS. Dá um frio na barriga sendo o responsável por um grupo de dez pessoas. O deserto não é só areia: em alguns lugares o solo é bem duro, com uma camada muito fina de areia que mais parece talco de tão leve.
Durante a pedalada atravessamos diversos vilarejos, vimos sempre crianças felizes e curiosas com a nossa presença, mas também tivemos uma experiência negativa com duas delas jogando pedras nos nossos grupos – por sorte nenhum acidente. Também foram a exceção em toda a viagem.
Em Al Karak existem ruínas de um antigo castelo da época das cruzadas, que também foram visitadas.

3° dia – Al Karak – Dana
Fomos dar um volta no castelo que se localiza em um ponto estratégico e tem linda vista para a região de Al Karak. Existe um verdadeiro labirinto de corredores e salas no subsolo do castelo. Muito interessante e vale a pena a visita.
Depois disso, seguimos de ônibus até o início de nossa etapa a pedal. Hoje a região tem mais vegetação na forma de arbustos espinhentos, o que gerou os primeiros furos de pneus e, devido ao terreno com trechos bastante técnicos com grandes pedras e cascalho solto, também tivemos o primeiro raio quebrado.

Não passamos por nenhum vilarejo; pedalamos o dia inteiro isolados no deserto. De manhã fez mais calor que a tarde; os dias normalmente alcançavam 39 graus. Chegamos à entrada da Reserva Natural de Dana e seguimos em um pequeno caminhão 4×4 até o nosso primeiro acampamento em tendas de beduínos.
No alto da borda das montanhas se vê o deserto, uma planície que chega até o fim do horizonte. Fizemos uma curta caminhada para ver o pôr do sol. Na reserva ainda vivem hienas, lobos, antílopes ôrix, raposas e algumas espécies de gaviões.
O bacana é que tudo ainda é bem rústico e confortável. Não tem banho quente. Algumas lâmpadas espalhadas pelo acampamento funcionavam até determinado horário, alimentadas por painéis solares ou eventualmente por um gerador. Dormir em uma tenda beduína foi ótimo, curtindo o som das cigarras.

4° dia – Dana – Pinewood
Seguimos pedalando por um trecho isolado no deserto, novamente muito técnico com grandes pedras pelo caminho. Lindas paisagens com os seus tons amarelados.
Ao longe avistamos outro castelo da época das cruzadas, o Shobak. Nosso almoço foi feito em sua base. Visitamos suas ruínas que não são tão bem conservadas como o castelo de Al Karak, mas não menos interessante com os mesmos sistemas de galerias subterrâneas.
Na etapa da tarde só seguiram três ciclistas, o médico e eu. Os outros resolveram seguir de ônibus até o próximo acampamento em Pinewood, por causa do calor e por ser a parte mais difícil e técnica do dia, porém um trecho lindo com morros e um sobe – e – desce sem parar.
Chegamos no final da tarde ao acampamento chamado Pinewood (por causa dos pinheiros que lá existem). Aqui muitos dormiram ao relento, curtindo o som das árvores e bebendo um chá em volta da fogueira.

5° dia – Pinewood – Wadi Musa/Petra
Trecho curto. Resolvemos fazer um grupo só, já que outra parte seguiria de ônibus.
Este foi o dia do downhill mais técnico da viagem, com imensas valas, buracos e pedras. Chegamos a Wadi Musa aproximadamente ao meio dia. Nos trocamos e seguimos de ônibus até a entrada de Petra. O trekking em Petra, que é uma das novas sete maravilhas do mundo, é um dos highlights de nossa viagem e demorou quase quatro horas e meia.

Primeiro se caminha aproximadamente dois quilômetros a partir do centro de visitantes pelo Siq, uma espécie de garganta e corredor com paredes que chegam a até cem metros de altura nas rochas. No final do corredor ficamos impressionados com a famosa Khazne Faraun, a construção também conhecida como a porta de entrada de Petra. Khazne Faraun também ficou conhecida no filme Indiana Jones e a última Cruzada.
Parte de nossa visitação foi guiada, e muitas histórias e informações foram contadas por nosso guia. O que achei muito interessante foram as soluções criadas para o sistema de água e abastecimento da cidade, boa parte escavada nas rochas. Depois tivemos duas horas livres e aproveitei para tirar fotos e conhecer outros cantos e construções escavadas nas pedras dessa antiga e “perdida” cidade, que foi redescoberta em 1812 no meio do deserto por um suíço disfarçado de árabe.

6° dia – Wadi Musa – Al Quwayrah
No início pedalamos por morros e rochedos com vistas lindas para o deserto. Depois do sobe – e – desce pedalamos por areião. Nessa etapa o truque é murchar os pneus para maior contato, e também achar a velocidade ideal para transpor bancos de areia mais macios. Se você pedala muito devagar, você atola, se muito rápido, você se cansa desnecessariamente. Com o tempo vai se pegando a manha e reconhecendo qual a melhor areia e velocidade para se pedalar.
Na minha opinião essa foi uma das etapas mais bonitas; o deserto aqui tem alguns enormes rochedos que parecem ilhas espalhadas em um mar de areia.
Nosso almoço foi em “3 Trees”, que são três árvores que sobrevivem de alguma forma no meio do deserto. Dormimos novamente ao relento ao lado de um enorme rochedo, curtindo uma noite linda e estrelada.

7° dia – Al Quwayrah – Wadi Rum
Dois terços da etapa foram novamente na areia, bem difícil, mas divertido ao mesmo tempo. A região de Wadi Rum é uma reserva natural.
Seguimos de jipe até o nosso acampamento. Neste local a força do vento tem escavado e criado interessantes formas nos rochedos há milhares de anos, e um dos pontos mais conhecidos e visitados é uma ponte natural escavada na rocha.
A viagem ainda durou três dias. Seguimos de Wadi Rum para Aqaba, no sul da Jordânia, às margens do Mar Vermelho. Aproveitamos para nadar e mergulhar.
Fiquei maravilhado com a Jordânia e o seu deserto, que muito me impressionou pela história, cultura e, claro, as pedaladas que poucos têm a oportunidade de realizar.












