As Baleias Francas foram quase extintas. Felizmente, elas voltaram e hoje, em Santa Catarina, quem pedala à beira-mar pode avistá-las.

Além de moralmente condenável, a caça às baleias é uma atividade banida por lei em toda a costa brasileira. Se isso hoje soa óbvio, não era assim durante todo nosso período colonial e até bem depois da independência, já que há pouco mais de 40 anos foi registrada a morte do último animal em águas catarinenses, no município de Imbituba.

Quando utilizavam o rudimentar e cruel método de arpoar as baleias, muitas vezes alvejando primeiro o filhote para depois atrair o animal adulto, os caçadores nem de longe estavam interessados ou necessitavam de sua carne para a sobrevivência. Almejavam tão somente os em média 6.800 litros de óleo que cada animal rendia, matéria prima de expressivo valor econômico para a época, tanto que conta-se que sobre seu lucro foram consolidadas muitas das populações da costa catarinense.

A cobiça pelo ouro em banha no século XX teve nos matadores artesanais da costa catarinense um dos seus principais atores – embora bem menos exterminadores que as esquadras americanas e europeias operando em latitudes mais baixas no século anterior, com métodos bem mais sofisticados e responsáveis por quase extinguir a Baleia Franca em todo o Atlântico Sul já no final dos anos 1900. O ciclo vivenciado no litoral brasileiro, portanto, já vinha abalado por um forte declínio causado pela larga escala da matança em épocas passadas.

Depois do último abate de uma Franca, em 1973, sua aparição na costa catarinense tornou-se praticamente nula, a ponto de ser dada como extinta. Ainda assim, avistagens esporádicas estimularam pesquisas que indicaram uma nova regularidade, a partir de 1981, da presença das “baleias pretas” e seus filhotes em nossas águas. Nas décadas seguintes, investigações mesclando censos aéreos e avistagens por terra permitiram delimitar uma nítida área de concentração das Baleias Francas, entre a Ilha de Santa Catarina e o Cabo de Santa Marta.

Dado este aumento de concentração e a importância do nosso ambiente costeiro, fundamental para a reprodução da espécie, um decreto federal assinado em 2000 criou a APA (Área de Proteção Ambiental) da Baleia Franca, numa área de 156.100 hectares entre a Praia do Rincão e o sul da Ilha de Santa Catarina, abrigando costões, dunas, banhados e lagoas.

Embora a temporada reprodutiva seja de julho a novembro, é de agosto a outubro que a APA registra a maior incidência de aparições. Correr o risco de avistá-las é um ótimo motivo para pedalar pela região, já que as Francas, assim chamadas por serem extremamente dóceis, costumam exibir-se em enseadas protegidas muitas vezes bem próximas da faixa costeira. Não bastando esta incrível possibilidade, há que se considerar que estamos em um dos recantos mais belos do litoral brasileiro, dono de hotspots e cartões postais de altíssimo nível. Para sentir o cheiro do mar em pedaladas na região da APA da Baleia Franca, sugerimos alguns roteiros imperdíveis, do cicloturismo ao MTB. Aí vão:

1 – Rota das Baleias

©Jonatha Jünge e
©Fernando Angeoletto
©Jonatha Jünge e ©Fernando Angeoletto
©Jonatha Jünge e ©Fernando Angeoletto

Com duração de 3 a 5 dias, esta travessia percorre uma grande parte da APA, desde Imbituba até a Guarda do Embaú, ou Florianópolis no roteiro completo. O litoral cênico e as cores da cultura local, marcadamente açoriana com raízes na pesca artesanal e agricultura de subsistência, são temperados com trechos como a antiga Fazenda dos Búfalos, atualmente Projeto Gaia Village, uma imensa área de preservação particular com paisagens que beiram o surreal entre barreiras de dunas, alagados e restingas. A predominância das pedaladas à beira-mar aumenta as chances de avistar as baleias, embora haja trechos em pequenos morros com mirantes e caminhos do interior para diversificar a experiência.

2 – Floripa MTB

Para públicos mais radicais, vamos atravessar trilhas singletrack, costões e pontais como a da Vigia ou Campana – de onde se observam os cardumes para pesca artesanal, mas quem sabe uma Franca não surge no horizonte? Boa parte dos maciços rochosos da Ilha, entre a ponta do Gravatá e a Praia de Naufragados, são explorados por trilhas com visuais fantásticos, muitas delas desconhecidas até da população local. Inclui a famosa travessia do Sertão do Ribeirão, estrada de terra com fortes morros e um peculiar alambique de cachaça perdido nos confins do limite com o Parque Municipal da Lagoa do Peri.

3 – Volta à Ilha

©Jonatha Jünge e ©Fernando Angeoletto
©Jonatha Jünge e ©Fernando Angeoletto
©Jonatha Jünge e ©Fernando Angeoletto

Reportada na edição 047 (dezembro/2014) da revista, é uma das mais desejadas experiências em cicloturismo do país, já que permite percorrer os quatro quadrantes da Ilha fugindo do óbvio do turismo de massa sem, contudo, deixar de visitar os atrativos consagrados. O roteiro mescla paisagens urbanas e rurais, além dos 360o de mar que circundam este “pedacinho de Terra, perdido no mar, beleza sem par” (cantado no Rancho de Amor à Ilha, o hino de Florianópolis).

Quem leva

Caminhos do Sertão Cicloturismo
www.caminhosdosertao.com.br