Uma cidade do interior da Bahia que está pedalando, ciclistas querem ser visíveis

Você sabia que temos mais bicicletas do que veículos no Brasil? De acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) são 50 milhões de bikes e 41 milhões de carros em solo brasileiro. Entretanto, somente 7% das viagens são feitas por bicicleta. O que mostra a necessidade de políticas cicloviárias por parte dos municípios brasileiros, além dos benefícios que a bicicleta proporciona como uma mobilidade mais sustentável, redução da poluição ambiental, sem emissão de gases poluentes do efeito estufa.

Em Paris, na França, que deseja ser considerada a capital mundial da bicicleta, possui 1000 quilômetros de rede de ciclovias. A ideia é que o cidadão francês possa se deslocar em até 15 minutos para ter acesso a serviços, mercado, parques e lazer.

Dado Galvão é documentarista, ciclista, fotógrafo e teólogo. Ele é morador da cidade de Jequié (BA) e realiza ações de incentivo ao uso da bike, município que tem 160 mil habitantes, localizada no interior baiano, distante aproximadamente 400 quilômetros de Salvador. Muitos municípios no Brasil não possuem ciclovias ou ciclo-faixas e até mesmo nenhuma política pública voltada para o incentivo do modal. Além de produzir vídeo-documentários a respeito da temática, ele participou de uma iniciativa – uma “vaquinha” entre ciclistas para colocar um outdoor na principal avenida do município com a frase “Jequié está pedalando, queremos ciclovias”. Um pedido por implantação de ciclovias na cidade, por acessibilidade, maior segurança para os ciclistas, ciclo-faixas e um bicicletário gratuito no centro da cidade. Na imagem do outdoor está um ciclista invisível, para que ele seja visto pelos poderes executivo e legislativo do município.

“Por mais que se tenha muita gente pedalando, a gente sabe que é fenômeno mundial, em Jequié, é visível pessoas pedalando seja para ir trabalhar ao trabalho, praticar esportes, ou em grupo. Mas nós não somos vistos pelo poder público. Eu faço um apelo para que criem políticas públicas para o ciclismo. Não temos placas de sinalização, ciclo-faixa, ciclovias, incentivo aos grupos que realizam o ciclo-turismo e competições. Nós somos invisíveis”, relata o egresso.

O pedido da população e de ciclistas da cidade do interior baiano obteve um efeito positivo. Em 16.mar.2021, a superintendência de trânsito do município de Jequié (SUMTRAN), iniciou estudos técnicos para implementação de ciclovias na cidade. O poder da mobilização mostra o exercício da cidadania, o que pode gerar melhorias para os ciclistas.

A SUMTRAN informou que serão realizadas campanhas de educação em trânsito, um processo licitatório até o mesmo de maio, e a implantação de ciclovia.

A falta de placas de sinalização ficou evidente, quando em agosto de 2020, foi encontrado um pedido numa placa artesanal de papelão, fixado em um poste, com as frases produzidas pela ciclo-ativista Gil Bike: “Respeite os ciclistas”, “Tá com pressa? Vai de Bike”. Assista ao vídeo de autoria do cineasta.

A placa de papelão foi fixada na Rua Brigadeiro Sá Bittencourt, bairro do Jequiezinho. Foto: Perfil Ciclo Olhar

“O ciclista tem que deixar ser tratado como invisível. Nós precisamos de legisladores, que criem leis sobre estabelecimentos com determinado tamanho seja obrigatório um bicicletário, leis criativas. Esperamos que não só em Jequié, mas em outros municípios do país tenham políticas públicas voltadas para o ciclismo, porque faz bem ao corpo, bem a cabeça e ao coração”, comenta o documentarista.

Galvão é fundador do movimento Ciclo-Olhar, composto por ciclistas de vários locais do Brasil que fotografam momentos de lazer e do cotidiano, sempre com o apoio da bicicleta. Ele recebe as fotos, e então publicadas no perfil do Instagram Ciclo-Olhar. Um dos slogans, das campanhas desenvolvidas pelo projeto é “Respeite o ciclista, ser humano como você”.

O documentarista explica como iniciou o movimento Ciclo-Olhar: “Comecei a observar nos grupos de ciclistas o uso do celular, ele é usado para revelar uma cidade diferente que é possibilitado por esse veículo espetacular.  Ver a natureza. A bicicleta estimula um olhar mais sensível”, diz Galvão. Para conhecer mais sobre o projeto, clique aqui.

Foto publicada na iniciativa Ciclo-Olhar, que já possui mais de 3.600 publicações. O projeto que tem como slogan “Movimento de quem anda de bike e fotografa”, também realiza concursos culturais com a temática de direitos humanos. Foto: Perfil Ciclo Olhar.

De acordo com pesquisa da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), que analisou os números registrados desde 2010 pelo Sistema Único de Saúde (SUS), foram cerca de 13 mil internações hospitalares causadas por atropelamentos de ciclistas, o que representa 15 milhões de reais para o tratamento destes pacientes em hospitais públicos. Nos últimos dez anos 13.718 ciclistas perderam a vida em acidentes de trânsito em todo o país. Segundo os dados do DataSus em 2019, 1358 pessoas perderam a vida no país em acidentes com bicicletas, uma leve queda em relação a 2018, quando foram contabilizados 1363 óbitos.

Movimento @cicloolhar

A procura por bicicletas aumentou em 2020

O mercado de bicicletas cresceu em 2020, foi registrado o aumento de 50% nas vendas das bikes em relação a 2019. O levantamento foi realizado pela Aliança Bike (Associação Brasileira do Setor de Bicicletas), em pesquisa que contou com participação empresários do setor, no mês de janeiro desse ano. Houve acréscimo de 118% nas vendas durante junho e julho de 2020, em comparação ao mesmo período de 2019.

Com a pandemia, o setor de manutenção de bicicletas teve dificuldades no reabastecimento de peças com aumento da demanda. A população tem utilizado a bicicleta como uma alternativa para evitar aglomerações no transporte público, assim, reduzindo o risco de contágio da Covid-19.

A bicicleta tem menor preço para a aquisição em relação a outros meios de transporte como motocicletas ou carros, além de contribuir com o meio-ambiente, e com prática de atividade física. Essa tendência de aumento de vendas de bikes também ocorreu em países como Estados Unidos, China, Alemanha, Inglaterra e Irlanda.

Em 2021, de acordo com Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares (Abraciclo) a expectativa é de 750 mil unidades, estimativa das fabricantes de bicicletas instaladas no Polo Industrial de Manaus (PIM), que projetam um volume 12,8% superior do que foi registrado em 2020.

Iniciativa quer conectar ciclistas e provocar transformação social

A ONG Bike Anjo é uma comunidade de ciclistas e através da bicicleta incentiva e ajuda pessoas a começarem a utilizar esse meio de transporte nas cidades, promovendo transformação social e gerando melhorias nos espaços urbanos. O projeto nasceu em 2010 na cidade de São Paulo, para trazer novos ciclistas para as ruas, otimizar o tempo de deslocamento da cidade e um trânsito mais humano. A Bike Anjo funciona como uma plataforma interliga pessoas que querem aprender a andar de bicicletas, dicas e tirar dúvidas.

No mundo, todos os seis continentes já possuem integrantes na iniciativa, são 38 países e 822 cidades em que projeto o acontece. No Brasil, são 1600 Bike Anjos participantes, em mais de 250 cidades do país – acesse (bikeanjo.org). Nessa iniciativa também é possível participar das Escolas Bike Anjo (EBAs), que são oficinas gratuitas organizadas por grupos de anjos em determinado município. Possuindo data, hora e local para acontecer.

O Bike Anjo está presente em mais de 250 cidades no país. Foto: Perfil Ciclo Olhar.

O Bike Anjo também participa de campanhas como o Dia Mundial sem Carro – comemorado em setembro e mobiliza a população a não usar automóveis e adotar meios de transporte sustentáveis, e ainda participam do Bike to Work Day – evento anual acontece no mês de maio, que estimula o uso da bicicleta para as pessoas irem ao trabalho.

Tags: bicicleta, política, mobilidade, Jequié.

Matéria realizada pela TV UESB, da Universidade Estadual do Sudoeste Baiano:

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